terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

BAIXO ADIDAS (parte 1)

Custou, mas finalmente tava tudo bem para o Leovegildo*. O show da banda dele no Trópicos (era começo de 1998, época do Carnaval) quase tinha sido desmarcado porque o baixista e o baterista tinham ido viajar, mas ele e Raul*, o outro guitarrista, acharam substitutos que toparam ensaiar a tempo. Antônio*, o baixista-estepe não tinha instrumento, mas eles descolaram um emprestado, todo preto com o escudo branco.

No dia do show, mais um monte de contratempos, inclusive briga com a namorada, mas acabou dando tudo certo. O show da banda dele, Apocalípticos Integrados*, rolou legal e os ânimos com a digníssima estavam acalmados. Tudo estava tão bem que, quando foram guardar os instrumentos no carro, estacionado ali perto, confraternizaram com algumas muralhas brancas. Esticaram nas costas do baixo, como se fosse uma pizza saindo do forno. Afinal de contas, aqueles eram os loucos anos 90.

Voltaram para o bar e foram interpelados pela banda que tocaria logo depois: “escuta, a gente viu que vocês têm um violão. Tem uma música nossa que fica mais legal no violão, como a gente gravou. Rola de emprestar?”, pediram. Claro que rolava. Leovegildo* emprestou a chave do carro para que Raul*, seu companheiro de banda, fosse buscar o violão e foi juntar-se à namorada para curtir a noite.

Quando terminou o show, Raul* pediu novamente a chave do carro, dessa vez para guardar o violão, Leovegildo* emprestou. Após uma espera mais longa do que o desejável, Peu*, o baterista-estepe daquela noite, chegou com más notícias.

- Deu merda .
- Como assim?
- Trancamos o carro com a chave dentro.

Puta que pariu. Leovegildo* pensou em todos os instrumentos e amplificadores guardados lá dentro, na encheção de saco que seria e em que diabos iriam fazer agora.

- E isso não é o pior.
- Como assim, não é o pior?
- Vem aqui ver.

Foram. Quando chegaram no carro, estacionado bem debaixo de um poste de iluminação, lá estava o baixo bem visível, deitado de costas para cima no banco do carona. Contra o corpo preto, como se fosse um anúncio surreal da Adidas, três listas brancas. Listas do tipo mais chave-de-cadeia.

- Tá, pessoal, tudo bem, se era pegadinha, funcionou. Tô encagaçado aqui.

Não era.

(continua)

* Os nomes foram alterados porque ninguém aqui é dedo-duro. Também não sejam nos comentários. A história foi enviada por um leitor gente fina; quem tiver alguma e estiver a fim de compartilhar e permanecer anônimo, é só mandar pra detropicosaounderground@gmail.com

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